Maria, Marta e Jesus.
João CruzuéOntem, quando fui à sala para orar, um pensamento veio e eu pedi ao Senhor que falasse comigo. Ao abrir a Bíblia, antes da oração, pude perceber que Deus falou. Como sempre gosto de fazer vim até aqui para compartilhar uma mensagem interessante. Pela primeira vez percebi que há um elo muito forte entre os fatos que se passaram na casa de Marta e Maria, irmãs de Lázaro, e a parábola do bom samaritano.
--Senhor fala comigo pela sua Palavra, eu pedi. Há dias em que temos mais necessidades de orar que outros, e esta semana em especial, tem sido bem difícil, pois são vários os motivos para bater, buscar e pedir recurso onde se pode achar.
Meu antigo companheiro, auxiliar dos meus tempos de "pastor" está fazendo quimioterapia. A esposa de outro amigo de muitos anos, também jaz, há três meses, em um leito de UTI. Seu cérebro foi muitíssimo danificado com três paradas cardíacas. E isso ainda não é tudo. Um antigo Pastor, dos meus tempos de jovem, está há mais de 12 anos em uma cadeira de rodas, deprimido... Não mais lê, deixou a fisioterapia, disse-me que apenas fecha os olhos e ora constantemente. Depois de ter sofrido um derrame, teima que só voltará à Igreja depois de curado e de uma forma maravilhosa. E já se passaram mais de 12 anos, e a forma "maravilhosa" não veio. Como você pode notar, eu não conseguiria mesmo estar com a minha alma tranquila diante dessas coisas muito tristes.
Ao abrir a Bíblia, me deparei com uma página inteira do final do capítulo 10 de Lucas. Primeiro, vem o texto na casa de Marta e Maria, continuando na parábola do bom samaritano. São palavras muito conhecidas, mas que ontem se fizeram novas para mim.
A preocupação de Marta era o serviço. Andava para lá, andava para cá; imagino: arranjando lenha, assoprando brasas do fogo, limpando as panelas, assando um pão nas brasas, talvez depenando alguma ave, ou mesmo temperando a parte de um cordeiro. O tempo passava depressa, a noite estava chegando e nada da ajuda de Maria.
Maria esquecera-se completamente do serviço. Assentada aos pés de Jesus, (não havia nem cadeiras nem mesas altas naquele tempo e naquela cultura) ouvia com o coração ardendo as palavras do Mestre. O tempo parou para ela, como ainda acontece em nossos dias, quando a presença do Senhor se faz muito forte em algum culto.
Marta estava preocupada em servir, e Maria esquecera-se de tudo para ouvir. E ouvia, e mais queria ouvir as palavras do Senhor. Marta receosa de não dar conta do trabalho, foi reclamar ao Mestre: Senhor, não te importas que minha irmã me deixe servir sozinha? Dize-lhe, pois, que me ajude.
A comunicação é uma coisa boa; precisamos mesmo nos comunicar, mas comunhão é algo muito mais profundo. Qualquer um pode se comunicar, dizer um bom dia, uma boa tarde, perguntar pela família, reportar o tempo. Alguns podem orar acompanhados por uma hora, duas ou quem sabe até uma vigília inteira. Mas nem todos assuntos falados significam comunhão; isto é mais que sabido. Por exemplo: tenho duas filhas. Uma já se casou e a mais nova já tem namorado. Imagine que eu me assente à sala e passe a tarde inteira junto aos dois "segurando vela". Eles podem conversar assuntos os mais variados, mas diante da minha presença nenhum deles vai ter a coragem para dizer "eu te amo".
Ano de 2008, século XXI - aqui estamos nós. Afadigados, preocupados, sem tempo, como diligentes Martas, quem sabe até dando ordens ao Senhor. É um corre-corre, um sobe-e-desce, um ensaia-ensaia, um prega-prega, um canta-canta, um ensina-ensina... Domingo, segunda, terça, quarta, quinta, sexta, sábado e chega o outro domingo. Estamos servindo? Sim! Estamos trabalhando? Sim! Estamos nos afadigando? Muito! Mas, por que estamos ficando vazios de alegria espiritual e colhendo tão pouco?
Não temos mais tempo para comunhão com o Senhor. Não somos mais como noivos apaixonados. Ele quer nos ouvir e também falar conosco, mas afadigados, não temos mais tempo para isso. Estamos nos enganando ao pensar que servindo dez vezes mais seremos muito mais espirituais e a Igreja, órgão, ou departamento que cuidamos vai decuplicar de tamanho. Aí começamos a fazer besteiras, pois não conseguimos mais ouvir lá no fundo do coração as orientações com Deus.
Causa.
A conseqüência disso pode ser entendida na mesma página da minha Bíblia. "Descia um homem de Jerusalém para Jericó e caiu nas mãos de salteadores, que o despojaram, espancaram-no, deixando-o quase morto. E, ocasionalmente, descia pelo mesmo caminho um sacerdote, que vendo-o, passou ao largo. Eis que de igual modo, também passava um levita, que também o viu e passou ao largo.
Quem são o sacerdote e o Levita? Decerto que representam os que conhecem e ensinam palavra de Deus. Apressados, estressados com a fadiga do serviço do altar, não têm mais tempo para ouvir a voz do Senhor, por lhes falta a comunhão. Eles são como as mãos de Marta.
"Mas um samaritano que ia de viagem aproximou-se do ferido e vendo-o moveu-se de íntima compaixão". [talvez por ter sofrido no passado um ataque semelhante] "E aproximando-se, atou-lhe as feridas, aplicando-lhes azeite e vinho. E pondo-o sobre a sua cavalgadura, levou-o para uma estalagem e cuidou dele. E partindo no outro dia, tirou dois dinheiros, deu-os ao hospedeiro e recomendou-lhe: Cuida dele, e tudo o que mais gastares, eu to pagarei quando voltar". Aqui o temos um resultado diferente, pois atuaram em conjunto o "coração" de Maria com as "mãos" de Marta.
Os três personagens viram a mesma cena, mas suas atitudes foram inesperadas. Os dois primeiros julgaram que sua religião ou seus afazeres eram mais importante e tinham prioridade sobre um estranho caído no chão. O serviço na frente do amor. O primeiro era um ministro a serviço do altar e o segundo um servidor do templo. Seus olhos não mais se comunicavam com o coração. Em algum lugar de suas vida eles perderam a compaixão e tornaram-se insensíveis às necessidades alheias e à voz do Espírito Santo. Do samaritano poderia se esperar tudo, menos compaixão. Dos religiosos, tudo, menos omissão. Atitudes inesperadas!
E foi assim que entendi, antes de começar minha oração, que não importa quão engajados nós estejamos em grandiosos projetos aos olhos alheios ou dos nossos próprios olhos. Há uma grande multidão muda, surda, padecendo grande miséria ao nosso redor. Se dermos prioridade somente às coisas que nos interessam, e relegarmos ao secundário os momentos que precisamos passar a sós com Deus, para ouvir a Sua voz e fazer a sua vontade, ficaremos irremediavelmente secos de compaixão.
Por isso, vamos colocar o título da mensagem na ordem correta: "Um coração de Maria nas mãos de Marta". Primeiro a comunhão e depois o serviço religioso.
Mensagem revisada em 13.01.2014.
Um comentário:
Obrigado irmão João Cruzue,
Mais uma vez fui muito edificado.
Que o Senhor nos ajude a buscar um coração como o de Maria, sem perdermos a voluntariedade das mãos de Marta.
PARABÉNS!
Pr. Carlos Roberto
Postar um comentário